12 junho 2010

 

Em Cape Town 2, África do Sul

Crônica de Luiz Fernando Veríssimo, 8/6/2010

Muitos países têm a mesma dicotomia (minha palavra de gravata da semana). Duas grandes cidades com características diametralmente opostas. Às vezes, até duas capitais do mesmo país, uma oficial e outra de fato. Ou um centro econômico e um centro cultural. Ou um lugar em que se ganha mais dinheiro e outro em que se gasta melhor o dinheiro. Você sabe o que eu quero dizer.

Na Itália, a dupla de opostos é Roma e Milão. Para os romanos, todo o Norte da Itália, onde fica Milão, é frio e germânico, meio Suíça, meio Áustria. Para os milaneses, a África começa em Roma. A rivalidade é enorme. Embora não deva ser verdade que na última grande erupção do Etna um jornal de Milão saiu com a manchete "Força, Etna!", torcendo para que as cinzas do vulcão não se limitassem a cobrir só a Sicília.

Na Inglaterra, a dupla é Londres x Manchester. Nos Estados Unidos, esticando um pouco a analogia, Nova York e Los Angeles. Enfim: São Paulo e Rio.

Na África do Sul, é Johannesburgo e Cidade do Cabo. Uma comparação injusta, já que Johannesburgo perde feio nos quesitos natureza e simpatia e ganha apenas na força econômica — e mesmo nisso a diferença não a favorece.

A região em que fica a Cidade do Cabo é governada por um partido de oposição, que se esforça para provar que pode mais do que os outros. Inclusive nos preparativos para a Copa, como vimos aqui nesses dois dias. A festa de inauguração, aqui, promete ser grande e rica. O objetivo é não ape nas impressionar visitantes, mas humilhar Johannesburgo, gastando mais.

Se Cape Town é Rio e Johannesburgo é São Paulo, as duas se parecem num aspecto que também une Rio e São Paulo, e toda esta grande África que é o mundo fora do condomínio dos ricos: a miséria insanada e aparentemente insanável.

As favelas que cobrem áreas imensas nos arredores das duas cidades não são piores do que as do Rio e de São Paulo, mesmo porque este tipo de cotejamento tétrico não tem sentido, mas o contraste talvez fira mais, porque a outra parte, a civilizada, é tão mais limpa e organizada do que aí.

A Cidade do Cabo e seus subúrbios são impecáveis. Um passeio pela rota dos vinhos da região é um passeio não apenas na Europa, mas numa Europa mitificada, que não existe nem na própria Europa.

Você volta do passeio para a cidade numa estrada magnífica, ladeada por favelas. Mas elas são baixas, como caixotes enfileirados, e, se você só olhar para a frente, ou para as belas montanhas no horizonte, se confundem com o chão.

Amanhã voltamos para São Paulo. Quer dizer, Johannesburgo.


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